Escritório, doce escritório
Talita Chaves, criadora do Inside the Office e curadora desta editoria, divide sua história de paixão por esse cantinho dedicado ao ofício que transformou sua vida, ampliou seu horizonte e refletiu as mudanças que vinham de dentro
por Layse Barnabé de Moraes
Fotos Talita Chaves
Muito além de um simples local de trabalho, o home office é o casamento da tão almejada produtividade com a inspiração íntima que só um cantinho da nossa casa pode ter. Esse espaço dedicado ao ofício, onde passamos tantas horas do dia, transcendeu paredes e transformou a vida da Talita Chaves, criadora do Inside the Office e curadora desta editoria.
“Transformar”, nesse caso, não é um verbo usado em vão ou só um modo bonitinho de dizer. Talita começou a sua carreira de jornalista numa grande empresa de petróleo e gás. Depois de 11 anos produzindo conteúdo voltado ao setor, 11 anos vivendo num ambiente padronizado, onde todos os móveis tinham a mesma cor, e tendo zero autonomia para decorar o seu escritório da forma como preferisse, ela decidiu colorir mais a vida: “senti vontade de alçar voo, aprender coisas novas, ganhar o mundo. Mas faltava coragem e um Plano B consistente para pedir demissão. Até que um belo dia, a vida resolveu dar o “empurrãozinho” que eu tanto precisava: em meio a uma enorme crise econômica que afetou o país inteiro, fui demitida junto com uma equipe de dez pessoas. Enquanto muitos se desesperaram, eu fiquei radiante com aquela tela em branco: uma oportunidade única de recomeçar! Não tinha a menor ideia do que o futuro me reservaria, mas consegui definir, com clareza, o meu primeiro passo: precisava conhecer e conversar com profissionais e artistas talentosos, que trabalhassem em ambientes repletos de cor e muita personalidade!”, conta ela.
Nascia assim o blog Inside the Office, lá em agosto de 2015. Talita então começou a fotografar ateliês e contar histórias de empreendedores criativos, usando da história de outras pessoas como impulso para encontrar o seu propósito e inspirar outros profissionais a fazerem o que amam e seguir o caminho do coração: “Em 2017, o que era apenas um site se transformou num estúdio criativo, com sede em Copacabana, no Rio de Janeiro. Hoje, além contar histórias e conhecer o ambiente de trabalho de pessoas que eu admiro, também organizo toda a programação do estúdio do Inside, onde oferecemos oficinas, cursos, palestras e workshops para fomentar a economia criativa no Rio”.
Decoração e autoconhecimento
Talita conta que a paixão dela por decoração despertou quando saiu da casa dos pais e foi viver por conta própria: “Escolher os elementos que irão compor o seu futuro lar é um verdadeiro processo de autoconhecimento. Quem já passou por isso sabe do que estou falando! Foi a partir daquele momento – já adulta, com mais de 30 – que eu pude finalmente identificar as cores, texturas, móveis e o estilo de decoração que conversavam com a minha essência. E nada é estático nessa jornada: a medida em que nos transformamos internamente e ampliamos nosso horizonte, a casa segue esse mesmo fluxo e reflete qualquer tipo de mudança que vem de dentro”.
O que ela ainda não sabia nessa época é que todo o processo da decoração da própria casa seria tão intenso a ponto de se tornar uma grande paixão e mudar completamente o seu rumo profissional, tirando as poltronas beges e cadeiras pretas de cena e abrindo a possibilidade para mergulhar em múltiplos espaços, cada um com um estilo e personalidade, histórias inspiradoras e pessoas empolgadas em fazer projetos ganharem vida.
A essência do home office
Talita conta que, ao longo desses anos de blog, ela teve a oportunidade de conhecer muitos espaços de criação inspiradores e todos tinham uma coisa em comum: refletiam a personalidade do dono – independente do porte do negócio de cada entrevistado. “Na verdade, o tamanho do escritório ou ateliê não chega a ser um fator considerável quando o assunto é a essência de quem trabalha ali. O que pesa mesmo é o quanto de você está presente nas paredes, cores, texturas e objetos de decoração do seu home office”, explica ela.
Talita reforça que, para ir em busca dessa essência, não precisa de muita coisa e se engana quem pensa que deixar transparecer no espaço aquilo que a gente grita por dentro tem a ver com investir um punhado de dinheiro: “uma boa pitada de disposição e criatividade já são mais do que suficientes para deixar qualquer ambiente de trabalho com a sua cara”.
Em resumo, a essência do home office transcende o espaço e é, na verdade, a essência de quem está por trás dele, sentado na cadeira, colando post it com lembretes, grifando livros, escrevendo textos ou atualizando a planilha do Excel.
E sabe uma boa forma de descobrir a nossa própria essência? Olhando para nós mesmos a partir do outro. Empatia. Senso de alteridade. Inspiração. Tudo isso junto, bem misturadinho e adivinha? Quando a gente menos espera, pronto: estamos nos conhecendo melhor, entendendo de onde viemos e porque escolhemos a cor x e não a y, porque amamos o que amamos, porque rendemos mais no contexto z e não no w. Lembrando que isso não é sobre chegar a algum lugar, mas sim sobre o caminho – e tem coisa mais legal do que ver o espaço ser fiel a nossas mudanças, aprendizados, novas memórias e bagagens?
Para te dar a mão no seu processo de autoconhecimento, e tendo como pano de fundo esse espaço tão querido, protagonista de grande parte do nosso dia, nesta editoria, a Talita vai te ajudar a decifrar uma pergunta complexa que ela mesma lançou, mas deliciosa de se aprofundar na tentativa de resposta: “como a gente pode colocar mais alma no nosso office? E de que forma podemos fazer isso sem muito investimento financeiro e usando o espaço que já temos disponível em casa?”.
Três passos para colocar alma no seu home office
por Talita Chaves
Primeiro passo
Faça uma análise do seu ambiente de trabalho. Como está a decoração dele hoje e o que você gostaria de mudar? Se você trabalha em casa, qual espaço disponível você tem atualmente para o seu home office? Você consegue delimitar bem a área de criação do restante da casa?
Segundo passo
faça um inventário de tudo o que você mais ama nessa vida: cores, objetos que tenham um valor afetivo, lembranças de viagem, pôsteres com ilustrações ou frases inspiradoras, itens de papelaria. Reúna todas essas referências e, em seguida, avalie quais delas poderiam fazer parte da decoração do seu home office! Vale lembrar que além de fazer sentido para você, essa curadoria deve ter alguma conexão com a natureza do seu negócio. Se você trabalha com lettering, por exemplo, que tal instalar prateleiras para expor seus livros prediletos de caligrafia? Outra opção é emoldurar frases com handlettering de artistas que você admira. Enfim, as possibilidades são infinitas!
Terceiro passo
depois de selecionar os objetos que traduzem a sua essência e a alma do seu negócio, pense na melhor forma de usá-los na decoração: retire da parede o que não faz mais sentido! Separe o que deve ficar exposto numa prateleira dos itens que podem ser colocados na mesa de trabalho, sem ocupar muito espaço. Alguma arte vai precisar de moldura? Ou quem sabe uma simples washi tape resolva o problema, se não houver muita grana para investir na décor? Para tudo há uma solução – acredite! Eu mesma já improvisei um aparador para o meu estúdio usando apenas duas banquetas e placas de madeira pinus!
Dicas simples para deixar o seu office mais acolhedor e cheio de personalidade
1. Use plantas na décor: elas trazem vida e aconchego para o seu espaço de criação
2. Pinte a parede do home office (ou parte dela) com uma cor diferente do restante da casa para delimitar espaço
3. Use uma grade aramada para pendurar recados, fotos e ilustrações
4. Crie um quadro de inspirações usando uma placa de cortiça ou a própria tela aramada
5. Mesmo que a sua mesa de trabalho não fique próxima a uma janela, dê preferência a espaços que recebem maior incidência de luz natural ao longo do dia na sua casa. Não adianta ter beleza se não houver funcionalidade e conforto
6. Ainda sobre conforto: opte por uma cadeira de escritório que te ofereça “qualidade de vida” – especialmente nas semanas de trabalho mais intenso, quando costumamos ficar muitas horas seguidas diante do computador
Por dentro do escritório de…
por Talita Chaves
Thais Mule | Designer de interiores
Formada em Moda, Thais Mule sempre foi apaixonada por decoração, plantas e projetos “faça você mesmo”. Tanto que atualmente está cursando Design de Interiores. No final de 2017, ela criou a marca Casa Dois Jardins, que une duas paixões da empreendedora: décor e paisagismo. A ideia é estimular as pessoas a levarem mais verde para dentro de casa – seja através de objetos de decoração ou oferecendo ajuda para quem sonha em ter mais plantas, mas não sabe como cuidar!
Para Thais, o home office é o espaço da casa que está sempre em constante movimento, justamente por acreditar que ele é uma das maiores fontes de inspiração para o seu trabalho. “Preciso olhar para ele e me sentir motivada a querer produzir mais e mais! E ter um espaço que reflete quem eu verdadeiramente sou me dá liberdade para criar – algo fundamental para mim!”, explica. Assim como muitos artistas e profissionais da área criativa, o moodboard tem um papel importante no processo de criação da Thais: “o moodboard é o norte do que eu quero seguir. Preciso olhar para ele e conseguir identificar – através dos símbolos, das cores e texturas – o caminho que vou precisar traçar para atingir o meu objetivo. Ele é parte fundamental do meu espaço de criação. Diria até que ele é tão importante quanto as minhas ferramentas de trabalho”, revela a empreendedora.
Pilar Rodriguez | Pintora
A Pilar é publicitária de formação, mas a arte sempre esteve presente na sua vida. Desde que começou a pintar em tempo integral, ela trabalha em casa, no home office que foi montado num cantinho da sala de estar. Para a artista, o home office estimula não só o seu processo criativo, como também o crescimento dela, como pintora. Projetos maiores têm feito a Pilar refletir sobre a ideia de montar o seu próprio ateliê.
“Quando comecei pintar em casa, há cerca de três anos, eu trabalhava basicamente com aquarela e pequenos formatos. Neste aspecto, estar em casa e, ao mesmo tempo, trabalhar com o que gosto e ainda ganhar dinheiro com isso era o melhor dos mundos para mim! Depois que os formatos das minhas pinturas começaram a crescer e passei a adicionar outras técnicas nas obras, como a acrílica – que suja muito e é mais difícil de remover depois de seca – já começo a sentir necessidade de sair de casa e montar meu próprio ateliê, onde eu possa trabalhar com grandes quadros, sujar tudo sem me preocupar e poder olhar as minhas peças de longe, para avaliar o resultado final”, explica a artista.
Enquanto esse dia não chega, o painel de referências que a Pilar montou, na parede do home office, continua sendo outra grande fonte de inspiração para a artista. “O meu painel muda a todo instante e ele é primordial para o meu trabalho! Muito mais do que decorativo, ele serve como um suporte visual para a pintura que estou desenvolvendo no momento. Croquis, aquarelas, paletas de cores, fotografias – tudo o que considero útil para que a pintura cresça, num determinado trabalho, vai para parede!”, revela.
Jessica Blanco | Meg&Meg
Formada em Design de Games, Jessica Blanco decidiu pedir demissão para criar o seu próprio negócio! Em 2015, ela fundou a marca Meg&Meg para produzir artigos fofos de papelaria e deixar a rotina de outras pessoas mais leve e divertida! Para ela, o escritório da Meg&Meg é uma grande fonte de inspiração para o trabalho que desenvolve no dia a dia da empresa. “Acredito que o office da Meg serve de inspiração não só para mim, mas também para quem segue a marca em busca de ideias para um espaço de trabalho mais aconchegante e motivador! Ele foi evoluindo conforme a empresa cresceu e hoje vejo que temos um espaço muito gostoso para criar e receber pessoas”, afirma a empreendedora.
Assim como no home office do Durval, o moodboard também tem destaque na decoração do escritório da Jessica! “Além de ser um lindo enfeite para o nosso cantinho, o moodboard é super útil para os dias de criação. É um espaço que uso para guardar ideias, cores e imagens que me inspiram. Percebo que o que entra ali acaba influenciando nos produtos que surgem ao longo dos meses. Fora isso, também temos algumas fotos, frases e coisinhas fofas penduradas. É bem legal bater o olho em uma memória especial, me motiva a trabalhar”, explica Jessica.
Durval Amorim | Designer
Durval Amorim é designer, aquarelista e criador do projeto No Rio de Bike – uma série de pinturas que retratam pessoas pedalando em meio aos cartões postais da cidade maravilhosa. Para o artista, o home office é um refúgio criativo! “Demorei um certo tempo até deixá-lo do jeito que eu queria e continuo melhorando, faz muita diferença ter um local próprio para pintar e criar. Esse cantinho me inspira e me energiza de uma forma muito positiva”, revela. Na decoração do seu ambiente de trabalho, o moodboard é fundamental: “uso para colar referências, rascunhos, post it com ideias, fotos que possuem valor afetivo e o que mais me der vontade. Toda semana ele está com uma cara diferente, vive em constante mudança. É um resumo do que me deixa feliz e inspirado”, conta o designer.
Débora Islas | Artista
A Débora é designer e ilustradora. Durante muitos anos, ela construiu uma carreira nas principais editoras do Brasil, em revistas como Atrevida, Capricho, Gloss, Alfa e Claudia. Atualmente, ela trabalha como freelancer, no conforto da sua casa. O espaço de criação da artista, assim como o seu trabalho, é extremamente inspirador! “O home office é aquele cantinho que separa o trabalho do lazer, dentro de casa, mas que está totalmente integrado com o resto. Ele está sempre em transição e acompanha a evolução do meu trabalho. Tudo é o mais prático possível, com as ferramentas expostas, de forma acessível, para serem usadas com facilidade! E como consigo manter tudo organizado, acabo criando um ambiente aconchegante e convidativo para o trabalho. Foram tantos anos trabalhando no ar condicionado, com mesa branca, sem vida, personalidade, espaço suficiente e sem poder dar o toque pessoal que, sem dúvida, ter um home office facilita a vontade de produzir”, confessa Débora.
Quando o assunto é decoração, a artista adora garimpar e reaproveitar objetos que seriam descartados! “Quando decidi colocar o quadro aramado na parede – que, inclusive, era uma peça de ferro velho que reformei e adaptei – a ideia foi justamente ter a liberdade para mudar as referências e os trabalhos, misturar com fotos, recados e lembranças! É uma bagunça arrumada. Cada item adicionado carrega algo importante. Com ele, não preciso de pregos, é só ir sobrepondo. E ainda consigo desocupar a mesa de trabalho, usando melhor este espaço vertical como apoio para lápis de cor ou tintas, por exemplo. É mais um ponto de praticidade e aproveitamento do espaço”, explica a ilustradora.
Pedro Henrique | Um Cartão
Pedro Henrique desistiu de construir uma carreira no Direito para se dedicar ao sonho de escrever. Estava tudo caminhando bem na vida dele até o dia em que bateu aquela vontade inexplicável de colocar os sentimentos no papel, de se expressar de alguma maneira. Decidiu escrever uma frase curta que fosse, num cartão, para expressar sentimentos do cotidiano. E assim nasceu, em 2014, o projeto “Um Cartão” que hoje conta com mais de 2 milhões de seguidores só no Instagram.
Até um ano atrás, o Pedro trabalhava em casa. Agora, ele divide a sua rotina de criação entre o home office e o seu escritório, localizado num coworking na zona sul do Rio. Para ele, a decoração do espaço de trabalho tem um papel fundamental para que ele se sinta confortável e estimulado a criar! “Quando você tem um espaço de trabalho inspirador, ele faz com que a sua arte floresça, de alguma forma. Eu fico confortável assim: em meio a um monte de cores, materiais, papéis, lápis, canetas – tudo isso me deixa bem! Eu tento sempre criar espaços como esse, que sejam o reflexo de quem eu sou, tanto no escritório quanto na minha casa. É muito importante para mim”, explica.
No escritório, a parede reúne apenas criações dele – e foi justamente essa a intenção: “como a sala é de vidro, a ideia era transformar o espaço numa vitrine do projeto “Um Cartão”, explica. No home office, o Pedro também não abre mão do moodboard, mas com uma diferença: em casa, a parede do espaço de criação inclui obras de outros artistas, que ele teve a oportunidade de conhecer através do Um Cartão. “Para mim, mais do que um painel de referências, essas obras que decoram o meu home office se transformaram numa verdadeira coletânea de memórias e afetos”, revela o artista.